terça-feira, 21 de abril de 2015

Liquidez

Aquela que toma qualquer forma
Foge do padrão, não segue a norma
Muda seu estado, varia com a temperatura
 Avança sem pedir licença
Entra pela mata escura
Todos sentem sua presença
 No mar ou na chuva descendo a rua
 Abastece as margens
 Produz belas imagens
 Em abundância sempre bem recebida
 Elemento água, fonte de vida

Estrada pra roça

Lá mesmo onde o tempo parou
A beleza da vida se desvendou
 Conversa fiada de fim de tarde
 Pouca zuada, nenhum alarde
 Cheiro de mato e terra molhada
 E aquele cafezinho com bolacha
 Pra dar o tom da prosa falada
 Avoador, polvilho, amendoim e canjica
É na cozinha onde tem a resenha mais rica
 Bolo de aipim, pamonha e suco de mangaba
 Alimento partilhado
 Encontro ritualizado

Paralelepípedos e aslfato

Entre paralelepípedos e asfalto liso prefiro caminhar na imperfeição das pedras amontoadas. Aquelas, que um dia podem até já ter sido obstáculos, hoje entortam os passos e nos tiram (?) da rota. Mesmo juntinhas deixam brechas. Constroem novos trajetos possíveis e uma condição de resiliência, pois estimulam o inusitado (espiritualidade) produzindo novas perspectivas (racionalidade) e uma simplória metáfora: não há simetria na vida.

Snapchat, Meerkat e Periscope

Esse três aplicativos de nomes estranhos, além de nos tornar poderosos comunicadores devido ao seu alcance, permitem também que as imagens e vídeos postados na rede sejam vistos e, logo depois, instantaneamente apagados. Ou não-armazenados. As ferramentas podem ser benéficas, mas a questão é: que uso faremos delas?

 A era do efêmero já chegou aos aplicativos. Talvez, (talvez...) seja só um reflexo de como a ética da humanidade já está em processo de decomposição: comprometimentos pontuais sem laços significativos; no jogo do deletável, a indiferença e o descompromisso se tornam comuns; nada precisa arquivado, guardado, plenamente experenciado ou dignamente vivido; a ambiguidade de se vivenciar papéis sociais de celebridade/anonimato põe à nu a a essência das postagens desses aplicativos: contraditoriamente, a falta de implicação social. Não há código regente. Aquilo que poderosamente informa, também vai definhando o metabolismo das relações.

 Existe aí uma bifurcação moral silenciosa, perigosa e (espero estar errado!) não muito promissora.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Insuficiência e Tédio - (ou a Ditadura da Felicidade)

Se a felicidade humana, (seja ela rara ou constante, tímida ou efusiva) se baseia em: (1) comprar coisas (adquirir para ter; ter para exibir; exibir para se sentir bem), (2) estar com alguém que nos compreenda e nos faça feliz no campo amoroso, (3) viagens com amigos para lugares pitorescos ou badalados e, (4) encontros cotidianos singelos que traduzem a sociabilidade humana e que fazem nos sentir vivos; então, a vida não passa de uma grande incompletude.

Buscar fora, constantemente, qualquer forma de satisfação, miúda ou plena, só demonstra o tédio e a insuficiência que é estar só. E, também, afirma (uma vez que oculta) nossa atual condição solitária que insistimos em negar: o abismo é temeroso e a angústia não é bem vinda. O primeiro ninguém quer ver. O segundo ninguém quer sentir. Para não lidar com o que incomoda (a solidão), vamos nos “embebedando na farra do prazer”, seja ele superficial ou temporário.